23 de abril de 2024 03:55

Cerimônia civil marca a reabertura da Catedral de Mariana

Restauração da “Igreja da Sé” durou quase sete anos, ao custo de R$10,6 milhões

FONTE AGENCIA PRIMAZ

Na tarde dessa quinta-feira (15), precedida por coletiva de imprensa, aconteceu a cerimônia que marca a reabertura da Catedral de Mariana, único exemplar das catedrais construídas no Brasil, no século XVIII, a manter suas características originais. Com o evento, o templo religioso é devolvido à responsabilidade da Arquidiocese de mariana, depois de passar por restauração completa de seus elementos arquitetônicos, estruturais, artísticos e de instalações, iniciada em fevereiro de 2016. As imagens dos altares laterais ainda vão passar por processos de restauração, assim como o órgão Arp Schnitger vai ter uma parte de sua estrutura reparada na Espanha, para posterior remontagem na Igreja da Sé.

A cerimônia civil de reabertura teve a participação do Arcebispo Metropolitano de Mariana, Dom Airton José dos Santos; do Padre Geraldo Dias Buziani, atual Pároco e Reitor da Catedral Basílica de Mariana; da Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em Minas Gerais; Débora do Nascimento França; do representante da ANIMA Conservação, Restauro e Artes, responsável pela restauração dos elementos artísticos, Artur Francisco da Silva Coelho; do Prefeito interino de Mariana, Ronaldo Alves Bento; do Presidente da Câmara municipal de Mariana, Juliano Duarte; e de Cônego Nédson Pereira de Assis, Reitor da Basílica Bom Jesus de Matosinhos (Congonhas/MG), que ocupava o mesmo cargo na Catedral de Mariana, por ocasião do início dos trabalhos de restauração.

Desafios da restauração

Falando à reportagem da Agência Primaz, Artur Coelho deu detalhes do processo de restauro dos elementos artísticos. “A gente já tinha policromia bem tratada no século XIX e, a partir do projeto original, que era fazer pequenos retoques e reintegrações nas perdas do forro, nós acabamos fazendo pequenas janelas em que a gente começa a fazer remoções pontuais para ver a qualidade do que tem por baixo. Em todas as tábuas do centro do forro, nós fizemos esses quadradinhos em busca das policromias anteriores”.

De acordo com o especialista, a partir desse procedimento, foi “detectada a qualidade da policromia subjacente”, com a constatação que se tratava do mesmo desenho, com diferença apenas a tonalidade da pintura. A partir daí, foi encaminhado um projeto ao IPHAN e à Arquidiocese, tendo sido obtida a autorização para a remoção da pintura mais recente.

Segundo Artur, foram muitas as dificuldades enfrentadas em todo o processo de restauração da Catedral. Entre outros fatores, ele aponta a defasagem entre o projeto original de restauro, desenvolvido em 2016, e a realidade constatada três anos depois, quando foram iniciados os trabalhos relacionados aos elementos artísticos. “O processo de restauração da policromia do forro foi um pouco difícil. “s diagnósticos do projeto original apresentavam defasagem, uma vez que o projeto foi aprovado em 2016, a gente chega aqui em 2019, e muita coisa já estava muito mais deteriorada”, afirmou.

Pintura do forro da nave central, recuperada no processo de restauração dos elementos artísticos
Pintura do forro da nave central, recuperada no processo de restauração dos elementos artísticos – Foto: Igor Varejano/Agência Primaz

Outro aspecto ressaltado por Artur Coelho foi a dificuldade enfrentada por problemas decorrentes de intervenções anteriores, relacionado à presença de cupins nas tábuas do forro da nave central da igreja. “As tábuas centrais do forro onde está o medalhão, nas intervenções anteriores, eles não removeram todos os cupins e acabaram passando uma camada de consolidação, que é cola PVA com pó de serragem, tapando os cupins ali dentro, mas eles continuaram circulando. A parte estrutural, que são as cambotas, também estavam bem deterioradas e acabamos fazendo a substituição total o que levou mais tempo do que o previsto”, revelou.

Artur considerou que a experiência foi marcante, em termos pessoais e profissionais. “Foi uma experiência muito satisfatória. Para falar a verdade, aqui nós superamos desafios, porque não esperávamos encontrar a igreja na situação que ela estava. Isso enriquece muito, isso nos transforma, nos dá novas soluções que foram encontradas ‘in loco’ para sanar diversos problemas. Algumas várias vezes, os forros, as capelas laterais, o que era referente à parte estrutural e a remoções de repintura, isso foi muito delicado. Então, com boa pesquisa, achamos todas as soluções”, finalizou.

Importância da restauração e da reabertura da Catedral de Mariana

O primeiro [sentimento] é, assim, de uma grande emoção neste momento. Porque eu me lembro de quando ela foi fechada em 2016, que era aquela expectativa, aquele sonho de ser restaurada. E agora, a gente poder reentrar, reocupar esse espaço todo restaurado, é uma grande emoção”, declarou Padre Geraldo Buziani à Agência Primaz.

De acordo com o pároco, a simbologia da cerimônia de abertura representa, além da preservação do patrimônio histórico, também se reflete na centralidade geográfica e religiosa da população marianense. “A Sé ocupa um espaço afetivo muito grande no coração dos marianenses, seja pelas celebrações dos momentos fortes, casamentos, batizados, mas também de toda arquidiocese, do clero, porque os eventos principais são sempre aqui. Então, é uma igreja que tem uma forte carga emocional para muita gente, e ela ocupa justamente o centro da cidade, a catedral está no centro”, acrescenta.

Esse aspecto foi ressaltado por Dom Airton, celebrando a reabertura e a possibilidade da volta de fiéis e turistas à Igreja da Sé. “O grande sinal disso é que a igreja, por sua natureza, ela está no meio do mundo, ela está no meio da cidade. Então o templo, que nós chamamos de igreja, que nós chamamos a Igreja da Sé, ou a Sé de Mariana, a Catedral de Mariana, é um grande sinal onde as pessoas se referenciam. Não importa quem seja, a porta está aberta, a pessoa entra, pode sentar, pode fazer a sua oração, pode ficar aqui contemplando, olhando isso tudo”.

Para o Arcebispo, a importância da restauração é mais destacada, levando em consideração as dimensões históricas e culturais. “Todo esse patrimônio tem características religiosas, culturais, espirituais, históricas e arquitetônicas. E não se constrói uma igreja dessa mais, não se constrói. Acho que ninguém tem coragem de começar alguma coisa desse tipo. Por quê? Isso tem que envolver a vida da pessoa. Quem mexeu com isso, no passado, ele se envolveu todo aqui. Então aqui está presente nas paredes, nas obras, na arte que tem aqui, está relatada a história só de um povo, mas de cada pessoa”, afirmou Dom Airton.

Composição da mesa da coletiva de imprensa, que precedeu à reabertura da Catedral de Mariana
Cônego Nédson de Assis (à direita, com o microfone), participou ativamente do processo de restauração – Foto: Igor Varejano, Agência Primaz

Relembrando o processo de restauração e ressaltando a importância da Catedral de Mariana, Cônego Nédson de Assis fez um pronunciamento durante a cerimônia, cujo texto foi obtido pela Agência Primaz, e é reproduzido a seguir, na íntegra.

No livro “Sé de Mariana, monumento de fé, devoção e expressão artística”, assim se expressa Dom Geraldo Lyrio Rocha: “É preciosa a Sé de Mariana!”

De fato, é uma preciosidade que temos em territórios mineiros. O coração do marianense pulsa com a Sé. É a Primaz das Gerais. E, justamente a partir daqui de Mariana, inicia-se a evangelização do interior do país, uma vez que todas as outras catedrais foram erigidas em dioceses próximas do litoral.

O início de sua construção remonta ao ano de 1713, quando começou a ser edificada a nova matriz da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, criada em 1704, por Dom Frei Francisco de São Jerônimo, Bispo do Rio de Janeiro.

Em 1745, com a criação da Diocese de Mariana, a edificação recebe as reformas necessárias para abrigar a catedral. O retábulo-mor perde o camarim, e o chamado pano de boca passou a ser a tela que hoje conhecemos, compondo o retábulo-mor. O motivo para a retirada do camarim é justamente a necessidade de prolongar a capela mor e nela ser instalado o cadeiral dos cônegos.

A imagem de Nossa Senhora da Conceição, retirada do camarim, foi transferida para um dos altares colaterais e, junto à imagem de São José, compõe a estrutura que hoje conhecemos.

Os altares de Nossa Senhora do Rosário e de São Miguel e Almas, são construídos para se criar o transepto, parte transversal que se estende para fora da nave central, formando com esta uma cruz.

O telhado entre as capelas devocionais foi elevado, criando as galerias superiores. Aqui temos um exemplar, o único restante, do que seria uma catedral construída no Brasil no século XVIII. Pois, dentre as dioceses criadas no Brasil, essa é a que melhor conserva os traços originais. As de Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo foram demolidas; as de Olinda, São Luiz e Belém foram bastante modificadas.

Após 300 anos de construção, a antiga Sé de Mariana recebe proposta de restauro pelo IPHAN, que sem dúvida será o mais representativo de todos os tempos, por contemplar a edificação não só na sua estrutura arquitetônica, mas também artística e religiosa.

Em fevereiro de 2016, no dia 14, a Sé teve suas portas cerradas para início das obras.

Depois de passar por criteriosa reforma estrutural, que contemplou todo o telhado da Sé, pisos, estrutura de travamento em madeira das paredes de taipa, foi executada a consolidação de toda estrutura com solo-cimento, o que possibilitou o trabalho arqueológico em todo o entorno da edificação.

Em 22 de janeiro de 2019, quando do início dos elementos artístico, em reunião com o proprietário da empresa ANIMA, o senhor Gilson e o responsável pela restauração, o senhor Artur, optou-se por resgatar ao máximo os traços originais da antiga Sé.

Após criterioso estudo, iniciamos o restauro dos elementos artísticos, com o desejo de devolver à catedral todo o esplendor do período de sua construção. Para tal, alguns elementos deveriam ser removidos. O principal destes foi a pintura, até então conhecida, da nave central, que sobrepunha a pintura original, que se encontrava em excelente estado de conservação, e era bem anterior à que conhecíamos.

A catedral marianense se destaca no cenário nacional, não só por ser a que melhor conserva os seus traços originais, mas também por ser o ponto de referência para a evangelização do interior do país. No cenário estadual, ´sem dúvida a mãe de todas as catedrais do Estado de Minas. As demais dioceses mineiras foram inicialmente daqui desmembradas. Entre essas estão Diamantina, São João Del Rey, Pouso Alegre e Belo Horizonte. No cenário arquidiocesano e municipal, os fiéis nutrem imenso valor efetivo pela catedral. É a Matriz!… É Mãe!…

Todos os dias, pela Sé, passam inúmeros marianenses para participar dos ofícios litúrgicos aqui celebrados, e para a oração pessoal; várias celebrações arquidiocesanas reúnem fiéis das diversas paróquias da Arquidiocese, em torno do mesmo altar, na Catedral marianense. Mesmo com as portas cerradas, muitos são os que se benzem ao passar diante da antiga Sé.

Devolvê-la à cidade e à Arquidiocese de Mariana, é momento de júbilo, de ação de graças, e de muita alegria.

Remontagem do órgão Arp Schnitger e restauração das imagens

Devido a uma infestação de cupins, o órgão Arp Schnitger vai passar por nova restauração na Espanha
Devido a uma infestação de cupins, o órgão Arp Schnitger vai passar por nova restauração na Espanha – Foto: Luiz Loureiro/Agência Primaz

Com investimento de R$10,6 milhões até o momento, a restauração da Catedral de Mariana não está completa, uma vez que o órgão não foi remontado e os altares laterais encontram-se sem suas respectivas imagens.

Na restauração realizada em 1982, foi utilizado madeira compensada em uma parte vital do instrumento, tendo sido detectada infestação por cupins, quando foi iniciada sua remontagem, este ano, como explicou à Agência Primaz o atual Reitor da Catedral de mariana, Padre Geraldo Buziani. “A empresa que desmontou [o órgão], uma empresa confiável que trabalha exclusivamente com órgãos, constatou [a presença de] cupins nos someiros, que é a parte que está abaixo dos tubos, que recolhem o ar. Em 1982, esses someiros foram revestidos de compensado, quando foram reformados em Hamburgo. Lá não tem o problema de infestação de cupim como aqui nós temos na nossa região. Então, com o órgão paralisado sete anos, deu essa infestação de cupins, e não é possível continuar a remontagem”.

A alternativa encontrada foi elaborar um projeto de nova restauração, a ser desenvolvido na Espanha, após a captação de recursos estimados em R$1 milhão. De acordo com Padre Geraldo, considerando toda a logística envolvida, em termos de transporte para a Espanha, trabalho de restauro, retorno ao Brasil e remontagem, a estimativa é que o órgão somente esteja em funcionamento 18 meses após a obtenção dos recursos necessários.

Ausência das imagens dos altares laterais não vai impedir o retorno das celebrações religiosas após a reabertura da Catedral de Mariana
Ausência das imagens dos altares laterais não vai impedir o retorno das celebrações religiosas na Sé – Foto: Igor Varejano/Agência Primaz

Outra questão, é que a restauração das 27 imagens que compõem os altares laterais não havia sido incluída no projeto original em 2016. Porém, este ano, o Conselho Municipal de Patrimônio (COMPAT) autorizou a liberação de R$280 mil, que serão repassados à Arquidiocese para a execução do restauro. “A questão das imagens é um projeto que a gente apresentou para o COMPAT, foi aprovado, e aí esse recurso vem pra Arquidiocese, que vai contratar a empresa para executar o restauro das imagens, no valor, mais ou menos de duzentos e oitenta mil reais, para, se não me engano, umas 27 imagens”, informou Padre Geraldo.

Galeria de imagens da reabertura da Catedral de Mariana

Confira abaixo, mais imagens da coletiva de imprensa e da cerimônia civil ocorrida nessa quinta-feira (15):

Arcebispo de Mariana, em manifestação durante a coletiva de imprensa que antecedeu a reabertura da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Altar lateral sem imagem religiosa que será restaurada após a reabertura da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Altar mor da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Fita amarela simbólica, instalada na porta principal, para a sessão de reabertura da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Integrantes da mesa da solenidade de reabertura da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Abóbada do retábulo mor da Igreja da Sé
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Altar da caepla da Igreja da Sé
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Representante da empresa responsável pela restauração, durante cerimônia de reabertura da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Altar mor da Igreja da Sé
Único altar lateral da Igreja da Sé que já ostenta a imagem tradicional
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Altar lateral da Igreja da Sé, sem a imagem religiosa que ainda vai passar por processo de restauração
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Preparação da coletiva de imprensa, que precedeu a reabertura da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Mesa da coletiva de imprensa realizada na Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Momento da reabertura da Catedral de Mariana, com a permissão para a entrada das pessoas que compareceram à cerimônia
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em Minas Gerais; Débora do Nascimento França
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Arcebispo de Mariana, em manifestação durante a coletiva de imprensa que antecedeu a reabertura da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz
Altar lateral sem imagem religiosa que será restaurada após a reabertura da Catedral de Mariana
Foto: Igor Varejano/Agência Primaz

Continuidade do programa de restauração

De acordo com Dom Airton, nos 79 municípios que compõem a Arquidiocese de Mariana está a maior concentração do patrimônio histórico. “Então, nós temos que ter essa preocupação, a Igreja vai ter sempre essa preocupação. E Mariana, mais do que talvez qualquer outra Igreja no Brasil, está a maior concentração do patrimônio histórico nacional”, afirmou.

Interior da Igreja de São Pedro, com visão do altar mor e das galerias laterais superiores
Interior da Igreja de São Pedro dos Clérigos, cujos sinais de deterioração preocupam a Arquidiocese de Mariana – Foto: Luiz Loureiro/Agência Primaz

Também declarou que o programa de restauração de igrejas vai continuar em Mariana, apontando as ações que estão em estudo. “Isso está tudo na linha [de ação]. Mercês, salvo engano, já está se conversando no COMPAT, e a Confraria dos Anjos também. São Pedro nós já estamos olhando para ela, porque já começa a dar sinais de alguma deterioração. E nós não vamos parar não. Isso aqui é um processo. Acho que um dos grandes elementos agora, de atenção nossa e dos órgãos do Governo, da Prefeitura, é a Igreja das Mercês. É a mais urgente, e isso vai culminar, talvez, no início de Mercês com a entrega [da igreja] de São Francisco”, revelou o Arcebispo de Mariana.

Não vamos parar não. Vamos tocar o carro ‘pra’ frente, como dizem. Mas, agora, nós temos que ficar preocupados também, não tanto com a restauração da Igreja da Sé, mas ficar preocupados, agora, com a manutenção, com a conservação, para não deixar chegar ao ponto que chegou”, finalizou Dom Airton.

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